segunda-feira, abril 22, 2024

FABIENNE BRUGÈRE, WARSAN SHIRE, FATOU DIOME, ANTÔNIO MADUREIRA, POEMA & POESIA NA ESCOLA!

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns Sirens (Zone Records, 1994), Passionate Voice (2004), Rough and Steep (2006), The Ten Thousand Steps (Biomusique, 2008), Journey (Sony, 2012), Eternal Om (Hearts of Space, 2016) e Calm and Comfort (Hearts of Space, 2022), da compositora, multi-instrumentista, vocalista e produtora estadunidense de origem armênia, Lisbeth Scott. Veja mais aqui.

 

PROSCRITO MIGRANTE DO MEU PRÓPRIO CHÃO: QUANTUM MUTATUS AB ILLO... – A minha vida entre parêntesis topadas & pontapés, sequioso então pelos inumeráveis devires das ensolaradas noites dos meus crebros breus infindos. Ainda tive bons motivos para rir tão à toa, empolgado demais para baldes enormes de água fria, resiliente demais para mais uma queda, otimista demais para mais um contratempo. Mesmo assim enfrentava o implacável, como se insistentemente ouvisse Barbara Oakley: A Lei da Serendipidade: a sorte favorece quem tenta... A persistência costuma ser mais importante que a inteligência...Tantas expectativas, oh não, quantos disparates, desempenho para um inconsequente – algumas vezes mergulhado em conflitos crônicos, ônus da própria natureza. Outras, péssimo humor, pouco animador - tão desencorajadoras situações aversivas, episódios nada atraentes soavam caus&feito no plausível, quando o mais era tão falso, pretextos e comiseração. A contragosto, frustrações e deixa pra lá, mais ouvia Aniela Jaffé: O homem é a única criatura com o poder de controlar o instinto pela sua própria vontade, mas também é capaz de suprimi-lo, distorcê-lo e feri-lo - e um animal, para falar metaforicamente, nunca é tão selvagem e perigoso como quando é ferido... Ah, como urrava pelas constâncias dramáticas, outras nem lembro - também desapontei muito, confesso. Vulgaridade e a reputação quase nenhuma, anonimato esparramado, davam vida desinteressante e sem sentido. Era só o eco de Agnès Bertholet-Raffard: Somos todos vulneráveis porque todos podemos precisar de cuidados, mas, ao mesmo tempo, somos todos interdependentes porque todos beneficiamos dos bons cuidados dos outros e, para que a sociedade funcione, é importante ter cuidados... Nenhum, olvidava os que tinha, nem os dei. Um tanto descascado, ainda pueril no meio de tempestades arrebatadoras explodindo minha cabeça e o envelhecimento precoce: eu e o meu país cambaleante, quão mudado se fez, até certo ponto mais que desagradável, e sabia - a ingenuidade mata: viver mais um dia do que resta e seguir em frente. Até mais ver.

 

A CASA

Imagem: Acervo ArtLAM.

1 - A mãe diz que dentro de todas as mulheres há quartos trancados; cozinha da luxúria, \ quarto da dor, banheiro da apatia. \ Às vezes os homens vêm com chaves. \ e às vezes os homens vêm com martelos.

2 - Nin soo joog laga waayo, soo jiifso aa laga helaa, \ Eu disse Pare , disse Não e ele não ouviu.

3 - Talvez ela tenha um plano, talvez ela o leve de volta para a casa dela \ só para ele acordar horas depois em uma banheira cheia de gelo, \ com a boca seca, olhando para seu novo e elegante procedimento.

4 - Aponto para o meu corpo e digo: Ah, essa coisa velha? Não, eu apenas coloquei.

5 - Você vai comer aquilo? — digo para minha mãe, apontando para meu pai que está deitado na mesa da sala de jantar, com a boca cheia de uma maçã vermelha.

6 - Quanto maior é o meu corpo, quanto mais quartos trancados há, mais homens vêm com chaves. Anwar não foi até o fim, ainda penso no que ele poderia ter aberto dentro de mim. Basil veio e hesitou na porta por três anos. Johnny de olhos azuis veio com uma sacola com ferramentas que usara em outras mulheres: um grampo de cabelo, um frasco de alvejante, um canivete e um pote de vaselina. Yusuf gritou o nome de Deus pelo buraco da fechadura e ninguém respondeu. Alguns imploraram, alguns subiram na lateral do meu corpo em busca de uma janela, alguns disseram que estavam a caminho e não vieram.

7 - Mostre-nos na boneca onde você foi tocado, disseram. \ Eu disse que não pareço uma boneca, pareço uma casa. \ Eles disseram: Mostre-nos a casa. \ Assim: dois dedos no pote de geleia \ Assim: um cotovelo na água do banho \ Assim: uma mão na gaveta.

8 - Devo contar a vocês sobre meu primeiro amor, que encontrou um alçapão sob meu peito esquerdo há nove anos, caiu nele e não foi visto desde então. Todo \ de vez em quando sinto algo subindo pela minha coxa. Ele deveria se dar a conhecer, eu provavelmente o deixaria sair. Espero que ele não tenha \ topei com os outros, os meninos desaparecidos de cidades pequenas, com mães simpáticas, que faziam coisas ruins e se perdiam no labirinto de \ meu cabelo. Eu os trato muito bem, uma fatia de pão, se tiverem sorte, um pedaço de fruta. Exceto Johnny de olhos azuis, que arrombou minhas fechaduras e entrou. Garoto bobo, acorrentado ao porão dos meus medos, toco uma música para afogá-lo.

9 - TOC Toc. \ Quem está aí? \ Ninguém.

10 - Nas festas aponto para o meu corpo e digo: É aqui que o amor morre. Bem-vindo, entre, sinta-se em casa. Todo mundo ri, acham que estou brincando.

Poema da premiada escritora, editora e professora Somali, Warsan Shire.

 

OS VIGILANTES DE SANGOMAR - [...] Ser mãe é viver a serviço de um ser em formação, mesmo quando você não quer mais existir para si mesmo. Sem Bouba, Coumba tinha perdido a mulher que tinha sido, deixando apenas a mãe de Fadikiine para se agarrar. Ser mãe é respirar por uma vida diferente da sua, Coumba descobriu isso. [...] é o que um olhar atento pode detectar nos olhos dos homens, quando a curva dos seus ombros protege as mulheres e as crianças contra a violência do mundo. [...] Toda criança sabe que sua mãe é o mastro sólido sobre o qual erguer a esperança, quando o moral está a meio mastro. [...] A liberdade total, a autonomia absoluta que exigimos, quando acaba de lisonjear o nosso ego, de nos provar a nossa capacidade de nos responsabilizarmos, revela finalmente um sofrimento tão pesado como todas as dependências evitadas: a solidão. O que significa a liberdade, senão o nada, quando já não é relativa aos outros? O mundo se oferece, mas não abraça ninguém e não se deixa abraçar. [...]. Trechos extraídos da obra Les Veilleurs de Sangomar (Hachette, 2021), da escritora senegalesa Fatou Diome.

 

ÉTICA DO CUIDADOTodas as vidas são iguais e os mais vulneráveis precisam de atenção... Estamos num capitalismo patriarcal: a economia e a política, globalmente, estão nas mãos de uma ordem masculina até manifestações preocupantes como o questionamento do direito ao aborto nos Estados Unidos. As desigualdades de género fazem, portanto, parte desta ordem, embora desde o movimento #MeToo as mulheres tenham exigido justiça de género. A ética do cuidado questiona as razões e a história destas desigualdades, enfatizando a natureza central de atividades como o cuidado dos corpos, o trabalho emocional e a resposta às necessidades vitais. O cuidado tem valor; deve ser pago tanto quanto possível e partilhado entre homens e mulheres. As mulheres são delegadas às tarefas de cuidado porque isso lhes foi imposto ao longo da história, a ponto de fabricar a perspectiva de uma natureza feminina amorosa! Agora, ninguém, por exemplo, é mãe em nome de um instinto. Criamos papéis, binários que prejudicam a nossa vida, que poderia ser muito mais livre. Da mesma forma, criamos profissões “femininas” que são menos remuneradas porque são consideradas fáceis. No entanto, cuidar de pessoas muito idosas em lares de idosos exige conhecimentos, experiência e competências, tanto quanto o trabalho de alvenaria. A ética do cuidado reside numa atitude aberta com a perspectiva de Carol Gilligan de uma “voz diferente”, de escuta do outro, em grande parte atribuída às mulheres ao longo da história. A atenção à singularidade de uma situação complexa onde as pessoas se relacionam, reabilitando o lugar das emoções e da racionalidade dialógica, é muitas vezes desvalorizada, ao contrário de uma moralidade que exibe princípios. No entanto, é disso que precisamos hoje... Pensamento da filósofa francesa Fabienne Brugère, autora da obra L'Éthique du “care ” (PUF, 2021), considerando o cuidado como uma ética com rosto humano, contextual e renovada na abordagem da razão e dos sentimentos, na atenção ao outro, nas formas de responsabilização. A fundamentação teórica é uma antropologia da vulnerabilidade, a possibilidade de tornar audível a voz das mulheres e dos vulneráveis. Esta ética está enraizada em debates da psicologia moral, da filosofia prática, da sociologia e da política. Hoje, a transição da ética para a política se faz graças à exigência do cuidado como filosofia social, voltada para enfrentar um ciclo político de desregulamentação e a crise dos estados de bem-estar social, razão pela qual as filosofias do cuidado apreendem através das vidas comuns ligadas ao cuidado, estes exércitos de populações invisibilizadas e marginalizadas na atual estrutura do mercado. Cuidado, ou como entender a interdependência e as dependências hoje, nas relações baseadas na solidariedade e na partilha de recursos.

 

COMPOSIÇÕES PARA VIOLÃO, DE ANTONIO MADUREIRA.

[...] Há artistas cuja música reverbera, de forma amplificada, muito mais que o significado isolado das notas e dos ritmos. Eles não seguem uma tendência, eles criam valores. Elas carregam no âmago de sua criação toda uma cultura, uma história, um modo de vida, um anseio expresso por um povo. Eles criam vínculos entre o universal e o regional, entre o rural e o urbano, entre uma cultura milenar e o hoje [...].

Trecho da apresentação do violonista, regente, escritor, comunicador e professor, Fabio Zanon, para o songbook Composições para violão Antonio Madureira (Autor, 2016), do músico Antônio Madureira, vinculado ao Movimento Armorial e integrante do Quinteto Armorial. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

 

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segunda-feira, abril 15, 2024

ALICIA PULEO, CRISTINA GÁLVEZ MARTOS, TATYANA TOLSTAYA & BARRO DE DONA NICE

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns Britten Piano Concerto (1990), MacGregor on Broadway (1991), Outside in Pianist (1998), Damba Moon (2001), Neural Circuits (2002), Quiet Music Sound Circus (2004) e Messiaen: Vingt Regards/Quatuor pour la fin du temps/Harawi (2010), da pianista, maestro e compositora britânica Joanna MacGregor. Veja mais aqui.

 

RENASCER DA MEMÓRIA, REENCONTRO NO ACERVO DE EMOÇÕES... - Nasci entre um rio e um sorriso de mulher. A vida era branda então e o Sol nascia por trás do morro para me ensinar a não ter medo da escuridão. Estradas se fizeram com todas léguas além do quintal e eu crescia no mundo pelos aromas do lugar ideal para se viver e fruir como se fosse invisível. Entrava dia com noite no meio de outro. Paula Fox ao ouvido: Ser humano é estar em uma história... A vida é se acostumar com o que você não está acostumado... O que tivera de ser e não fui, saí do traçado. Nunca tive tempo pra hesitações nem penitências. Sempre prestei muita atenção às coisas – as que são parte de nós e somos, apesar de não ouvir os que falavam, se é que diziam alguma coisa: olhos proutro lado, desde os de tantos de não sei quando, lonjura a perder de vista: era como se estisse diante dos perós dagora com seus perdigotos & malefícios. Advertia Louise Brooks: Não me desculpo com a habitual fuga de “não tentar”. Eu tentei de todo o coração... E só me senti verdadeiramente vivo e pela primeira vez quando agitou o maracá do cacique Sotero Kanindé contando da onça da Terra da Gia. E pisamos a areia macia Kapinawá do vale do Catimbau, caboco do mato pela furna do Furengo e com gente de Mina Grande, Massaranduba, Baixa da Palmeira, Malhador. O coro era um só: Eu sou caboclinho / eu só visto pena / eu só vivo na terra / para beber jurema!.. E dançamos com a Índia do Ozi. Sou Kadu na Retomada de Escada, sou Anaíra da Mulher Marcolina Macambira da poesia de José do Egito. Sou multicor Fino Barro e Jahbes de Rio Formoso, José Ayres da Vitória de Antão, seu Zito de Galileia. Sou Fervedouro que resiste em Jaqueira com a CPT-Mata Sul, o Memorial Cigano, o sarau do Nós por Nós – e Alexandre da Escola Livre sacou Nietzsche da bisaca: A arte existe para que a realidade não nos destrua... Toré! Toré nas poses pros cliques de Zzui, como se fosse uma festa pictórica do Bajado no cordão Fulni-ô, Kambiwá, Xucuru, Truká, Atikum, Pipipã, Pankararu, Tuxá. Arreia & Toré! Lá pras tantas todos se foram e mais da metade de mim foi embora: a minhalma indiafro, negríndia. E a gente precisava saber mais quem somos e onde estamos, o que temos e o que fazemos, como se dissesse Julia Kristeva: O amor é o tempo e o espaço onde “eu” me dou o direito de ser extraordinário. O que podia ser do que já fora soçobrava e mais me exauria, a memória trouxe de volta malunguinho: como eu queria que não acabasse amanhã nem depois nem nunca mais, já era noite pro adeus, fui embora com três folhas ao vento e uma canção no peito. Até mais ver.

 

UM PAÍS

Imagem: Acervo ArtLAM.

Um país é sempre uma ilha que você carrega: o contorno dos seus limites que são seus. Cegueira para o que você não entende; silêncio pelo que não entendem sobre você. \ É uma pelagem azul ou laranja que recebe os escassos raios de sol; a atmosfera – um lugar é sempre a singularidade da sua luz. \ Um lugar é cada uma de nossas mães. Nossa pedra de demolição dia e noite: deixe a mãe. \ É um aglomerado de passado vivo, preso como a longa cauda de um animal pré-histórico, é um presente muito maior do que podemos perceber. \ É uma guerra invisível e silenciosa que acontece enquanto você olha pela janela do transporte público; \ É uma guerra interior. \ É esquecer a fórmula para fazer qualquer coisa. \ Um país é uma esquina mil vezes pisada, cuja forma você também inscreveu, com manchas de fuligem e óleo. É também um tipo de pássaro, uma verdura. \ Tudo isso acontece quando você fecha os olhos. \ É não prestar atenção em que idades. \ Cada perda é um país, cada ser é uma nação inteira, cada ente querido é um lugar onde você cresceu, um território infinito em seus símbolos. \ Um país é um lugar que nunca mais é o mesmo; novos rostos e gestos. Pessoas que nascem, pessoas que morrem. Um círculo que se fecha com você lá fora.

Poema da escritora venezuelana Cristina Gálvez Martos, autora de obras como Psicopompa (Monte Ávila, 2015), Bicorne (Casa das Letras Andrés Bello, 2016), Fauna de Cal (Casa dos Escritores do Uruguai, 2020), Animal mais escuro (Fundarte, 2022) e Irmã amarga (LP5, 2024).

 

O LINCE - […] Você, livro! Você é o único que não enganará, não atacará, não insultará, não abandonará! Você fica quieto - mas ri, grita e canta: você é obediente - mas surpreende, provoca e seduz; você é pequeno, mas contém inúmeras pessoas. Nada além de um punhado de letras, só isso, mas se você quiser, você pode virar cabeças, confundir, girar, nublar, fazer lágrimas brotarem nos olhos, tirar o fôlego, toda a alma se agitará ao vento como um tela, subirá em ondas e baterá suas asas! [...] um livro é um amigo delicado, um pássaro branco, um ser primoroso, com medo de água. Coisas queridas! Com medo da água, do fogo, Eles tremem ao vento. Dedos humanos desajeitados e grosseiros deixam hematomas que nunca desaparecerão! Nunca! Algumas pessoas tocam nos livros sem lavar as mãos! Alguns sublinham coisas com tinta! Alguns até arrancam páginas! [...] É para isso que servem os poemas, então você não entende nada. [...] O mundo pode perecer, mas o moedor de carne é indestrutível. [...] Você lê, move os lábios, descobre as palavras, e é como se você estivesse em dois lugares ao mesmo tempo: você está sentado ou deitado com as pernas dobradas, a mão tateando na tigela, mas você pode ver diferente mundos, mundos distantes que talvez nunca tenham existido, mas que ainda parecem reais. Você corre, navega ou corre de trenó - você está fugindo de alguém, ou você mesmo decidiu atacar - seu coração bate forte, a vida voa e é maravilhoso: você pode viver tantas vidas diferentes quantas houver. livros para ler. [...] Eu só queria livros - nada mais - só livros, só palavras, nunca foram nada além de palavras - dê-me, não tenho nenhum! Olha, eu não tenho nenhum! Veja, estou nu, descalço, estou diante de você – nada nos bolsos da calça, nada debaixo da camisa ou debaixo do braço! Eles não estão presos na minha barba! Por dentro — vejam — também não há nada lá dentro — tudo foi virado do avesso, não há nada lá! Apenas coragem! Estou com fome! Estou atormentado!... O que você quer dizer com não há nada? Então como você pode falar e chorar, com quais palavras você tem medo, quais você pronuncia durante o sono? Os gritos noturnos não vagam dentro de você, um murmúrio estrondoso do crepúsculo, um grito fresco da manhã? Aí estão as palavras – você não as reconhece? Eles estão se contorcendo dentro de você, tentando sair! Ali estão eles! Sao seus! Da madeira, da pedra, das raízes, crescendo em força, um mugido surdo e um gemido nas entranhas estão tentando sair; um pedaço de língua se enrola, as narinas rasgadas incham de tormento. É assim que os enfeitiçados, espancados e retorcidos fungam com um lamento sarnento, os olhos brancos e fervidos trancados em armários, a veia arrancada, a espinha dorsal roída; isso mesmo, é assim que seu pushkin se contorce, ou mushkin - o que há em meu nome para você? - pushkin-mushkin, jogado no morro como um ídolo negro peludo, para sempre achatado pelas cercas, até as orelhas em di, o pushkin toco, sem pernas, seis dedos, mordendo a língua, nariz no peito - e a cabeça não pode ser levantada! - Pushkin, arrancando a camisa envenenada, cordas, correntes, cafetã, laço, aquele peso de madeira: deixe-me sair , deixe-me sair! O que está em meu nome para você? Por que o vento gira na ravina? Quantas estradas um homem deve percorrer? O que você quer, velho? Por que você me incomoda? Meu Senhor, qual é o problema? Tédio, ah, Nin! Pegue as tintas e chore! Abra bem a masmorra! Estou aqui! Eu sou inocente! Estou com você! Estou com você! [...]. Trechos extraídos da obra The Slynx (Houghton Mifflin, 2002), da escritora russa Tatyana Tolstaya.

 

ECOFEMINISMO - Os problemas das mulheres são de várias ordens: de acesso aos recursos, que em cifras globais mundiais se dá de forma absolutamente inferior aos homens, de reconhecimento, por que a cultura ainda tem um traço masculino muito profundo, de violência de gênero, porque o número de mulheres vítimas de violência e assassinadas é enorme em todo o mundo, ainda que seja pior em países com problemas econômicos, de representação política. Todos estes problemas estão ligados uns aos outros por laços e por causas bidirecionais. Em uma palavra, se retroalimentam. Quanto maior dificuldade de alcançar um salário digno, mais as mulheres terão que suportar a violência de gênero e menos poderão ter tempo de corrigir e transformar a cultura. Por sua vez, se a cultura seguir repetindo os mesmos tópicos patriarcais, mais dificuldade teremos para fazer com que diminua a violência de gênero, para aumentar nosso reconhecimento social, para alcançar postos de decisão política e conseguir trabalho com salários dignos. A situação das mulheres, que são a metade da humanidade, é uma questão de justiça social que se justifica por si só. Se a isso acrescentarmos que a inclusão da voz das mulheres pode melhorar a sociedade em seu conjunto, teremos uma razão a mais para apoiar velhos e novos pontos de nossa agenda... Pensamento da filósofa argentina radicada na Espanha, Alicia Puleo, que em sua obra Ecofeminismo para outro mundo possível (Cátedra, 2011) expressa: [...] A minha posição está enraizada na tradição esclarecida de análise de doutrinas e práticas opressivas. Reivindica a igualdade e a autonomia das mulheres, com especial atenção ao reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos que, em algumas formas de ecofeminismo, podem ser corroídos em nome da santidade da vida. Aceita os benefícios do conhecimento científico e tecnológico com prudência e atitude vigilante. Promove a universalização dos valores da ética do cuidado, evitando fazer das mulheres as salvadoras do planeta. Propõe a aprendizagem intercultural sem prejudicar os direitos humanos das mulheres e afirma a unidade e a continuidade da Natureza a partir do conhecimento evolutivo, do sentimento de compaixão e da vontade de justiça para com os animais não humanos, que o Outro ignorou e calou, mas capaz de ansiar, amoroso e sofredor. [...]. Ela também é autora de outras obras: Como ler a Schopenhauer (Júcar, 1991), Dialética da sexualidade. Gênero e sexo na Filosofia Contemporânea (Cátedra, 1992), A ilustração esquecida: La polémica de los sexos en el siglo XVIII (Antropos, 1993), entre outras.

 

DO PÓ AO BARRO...

O que é essencialmente humano não tem data, permanece...

Epígrafe do poeta e compositor Fernando Brant (1946-2015), extraída do catálogo Do pó ao Barro (2012), com a arte da artesã Dona Nice – Eunice Clotilde do Nascimento Oliveira, curadoria de Beto Normal e fotografia de Rachel Ellis. Veja mais aqui e aqui.

 

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segunda-feira, abril 08, 2024

ALICE FLAHERTY, ELMA MURRUGARRA, CHANTAL AKERMAN & ARREIA!...


 Imagem: Acervo ArtLAM.

Costumo chamar meu piano de minha casa, minha primeira morada. Porque depois de comer, dormir e fazer as coisas do dia-a-dia, o que faço há mais tempo na minha vida é tocar piano... Mas ser brasileira e viver no Brasil é estar imersa nesta complexa cultura de muitas misturas e singularidades culturais muito ricas. As músicas, os sons, a corporeidade brasileiros nos habitam...

Ao som de Homenagem a Kilkerry (2005), Tríplice andar (2013), Vivaldiana (2017) e Hinos de Pendências (2022), da compositora e professora Denise Garcia, autora da obra inédita C.A.C.O.S. (Celebração da Arte e Cultura Ocidental Sinfônica). Veja mais aqui.

 

TRAJETÓRIA DO LUGAR, ARREIA!... - Duma margem à outra do Una: tudo podia acontecer. E se do lado de cá os Ambulantes de Deus atravessavam a cidade nos burburinhos de lestoeste ou vice-versa, do lado de lá não só havia Paul: ventos austrais das quenturas equatoriais traziam o pipoco da guerra e peido de véia pelos dias de Sol ou chuva - não era nada daquilo que queriam, mas só o que lhes restavam. Mais que entre parênteses: numa banda o alvoroço de curumins, cunhatãs, curibocas, quilombolas, Ganga Zumba de Amaro, Zumbis de Macaco, andorinhas, calungas, ticoqueiras, todos como se fossem os condenados de Fanon espiando a almadia caeté dum lado pro outro. Na outra se via o povo descendo só pra ver a previsão das enchentes, no meio de açucarocratas e cheleléus, cangalhas e zambetas, tão enfáticos quanto ruidosos e nenhum decoro pra destruição do passado e sucessão de golpes dos bedeguebas de mal-assombro, gente famélica metida a grã-fina que vinha da procissão de homúnculos com seu andor medievo, estupidificados como os que precisam do olhar alheio para se orientar, vida tão mais sem poesia, gente que saía aos montes dos esgotos. Entre os que vinham e iam, topei: Joab, mô fio, pronde cê vai? Tomar uma, a hora está avexada. Logo atrás quase nem vi: Como é que foi, Iolita? A meninada cresceu... E a gente de velho mais menino: será a Besta Fubana? Não, não era. Era o duo de Iara & Ísis Campos no apogeu do espetáculo: Arreia! E a gente renascia caboclinhos do Rabeca, no sopro de Veludo do pife, quantos carnavais da infância e isso era mais que vida. Arreia! E ataviaram jactando-se com itapabas que vinham de Capoeiras, e se enfeitaram de festa com as igapebas das Alagoas, e proveram remelexos com os piperis de Bonito, e folgaram com os candandus de Catende e catamarãs de Pirangi, e arregaçaram arrearre! E adernaram pelas águas pretas até a foz da coroa grande: Arareia! Arreia! Ah-rá! E quando a hestória começou, big bang! O carão das horas, já era tarde, parecia. Havia bem não sei quantos anos, sem o que dizer no porém, para saber de Morgan Llywelyn: Se quiser ter paz, paz genuína, você deve aceitar todos os aspectos da sua personalidade e aprender a se sentir confortável com eles... Entretido com a frivolidade do festeiro, nem dei conta do que dissipava diante do Lobo do Mar de London, com meus naufrágios teratológicos na ilha de outras terras: haveria de passar a noite e o dia depois, e nenhuma lisonja naqueles olhos perturbadores de nunca mais, mas nunca mais mesmo. Arreia! E Simbad não era; a maldição dum pseudo-Anteu, talvez. A vida não terminava com o fechado das portas, cada qual a sua própria escuridão. Quase nem ouvi Charlaine Harris: Não procure problemas; já está procurando por você... Às vezes você só precisa se arrepender das coisas e seguir em frente... Era tarde demais pra isso e o desjejum era meu epítome na catalepsia das escolhas e quase nenhuma alternativa: só desmascarei meus equívocos com os dos outros e, se deu certo, só me arrebentei em todos os evidentes sinais de alerta, os encontros esparsos, a fuga iminente – era uma ameaça que havia deixado pra trás. O que me dizia Ida Lupino: Há beleza na imperfeição. Quero capturar os momentos crus e autênticos que nos tornam humanos. Há sempre mais para descobrir e explorar. Não tenho medo de correr riscos. As maiores recompensas vêm de sair da sua zona de conforto e desafiar a si mesmo... Era uma única vez & alguns dias & sobrevivente náufrago com o castigo da intimidade revelada: era só o Nito da Zezé. Os dias nos olhos, coração adentro jangada de vara eu voo, ressurreto das encruzilhadas... Até mais ver.

 

DOIS POEMAS

Imagem: Acervo ArtLAM.

TERRA - aqui onde a vassoura já não floresce e o altar do fogo sagrado foi extinto pelos ventos do leste, um homem em pura raiva arrancou a perna de outro homem, uma mulher deu à luz silenciosamente o filho de seu pai e uma criança nasceu dormiu. abraçados pelo desgosto, ninguém se conhece, ninguém se reconhece, isso é o terrível, a poeira enterrou quase tudo.

ATANÁSIA - Eu sou a tempestade filha de Hera e Zeus \ que, como seu pai, chronos \ às vezes eles me engoliram vivo \ cansado disso \ certa noite \ Eu roubei uma pedra de Deucalião \ e solicitei a permissão das Moiras \ então eu cortei o fio \ Eu joguei a pedra \ e eu me criei \ Depois do sétimo jejum tomei banho de sol \ nu ao lado de Asclépio \ fora \ às portas do hospital \ até uma quarta-feira \ Subi às colinas agostinianas \ e hoje estou sentado à esquerda de Apolo \ e a partir daí eu zombo dos saudáveis e dos doentes.

Poemas da jornalista e poeta peruana Elma Murrugarra, autora dos livros Jogos (2002), A Função dos Destinos (2004), Al Sur en Caral (2006) e Cuentos de Domingo (2009).

 

UMA FAMÍLIA - [...] Eu sei que isto me cansa mas tudo me cansa de qualquer forma sou uma pessoa cansada exceto quando por vezes me esqueço de mim mesma. [...]. Trecho extraído da obra Una familia en Bruselas (Tránsito, 2021), da premiada escritora e cineasta belga Chantal Akerman (1950-2015), que ainda se expressa: Nunca me considerei estranha ou diferente de alguma forma... Eu apenas tinha um jeito, um jeito que era meu e somente meu. Um jeito que talvez fosse um pouco peculiar, mas gostei disso. Gostei do fato de as outras pessoas não serem estranhas da mesma forma... Senti que ser estranho me convinha... Minha estranheza tinha algo, pensei. Um estilo. Um estilo que me pertenceu. Aí virou um hábito e não pensei mais no meu estilo estranho, era assim que eu era e pronto... Veja mais aqui.

 

DOENÇA DA MEIA NOITE – [...] O cientista que há em mim teme que minha felicidade nada mais seja do que um sintoma de doença bipolar, hipergrafia de um distúrbio pós-parto. O resto de mim pensa que separar artificialmente o cientista que há em mim e o escritor que há em mim é na verdade uma espécie de transtorno bipolar cultural, que muitos de nós temos. O cientista pergunta como posso chamar minha vocação de escritor e não de vício. Não vejo mais por que deveria fazer essa distinção. Sou viciado em respirar da mesma maneira. Escrevo porque quando não escrevo é sufocante. Escrevo porque algo muito maior do que eu entra em mim e enche a página, o mundo, de significado. Embora eu tema constantemente que o que escrevo esteja à beira de ser falso, essa força que me move só pode ser real, ou nada jamais será real para mim novamente. [...] Como a poesia e a literatura poderiam ter surgido de algo tão plebeu quanto o equivalente cuneiforme dos códigos de barras dos supermercados? Prefiro a versão em que Prometeu trouxe a escrita dos deuses ao homem. Mas então lembro a mim mesmo que… não devemos ser muito meticulosos sobre a origem das grandes ideias. Em última análise, todos eles vêm de um órgão enrugado que, quando mais saudável, tem a cor e a consistência de uma pasta de dente e, no final, apenas murcha e morre. [...] O que os prisioneiros fazem? Escreva, é claro; mesmo que tenham que usar sangue como tinta, como fez o Marquês de Sade. As razões pelas quais escrevem, as restrições extremamente frustrantes da sua autonomia e o facto de ninguém ouvir os seus gritos, são todas as razões pelas quais as pessoas com doenças mentais, e mesmo muitas pessoas normais, escrevem. Escrevemos para escapar de nossas prisões. [...] Na medida em que a autoexpressão transmite e reforça o caráter de uma pessoa, ela esclarece a ligação entre arte, excentricidade e doença mental. Quanto mais parecidos com nós mesmos nos tornamos, mais estranhos nos tornamos. [...] O impulso de escrever produz um primeiro rascunho; é o desejo de escrever bem que produz o segundo, o terceiro, o vigésimo. [...] Nunca consigo esquecer a possibilidade de bloqueio. Paradoxalmente, é isso que impulsiona a minha escrita – obrigando-me a deixar todo o resto de lado devido à possibilidade de que hoje seja o último dia em que poderei escrever. É outra maneira pela qual o bloqueio de escritor às vezes não é o oposto da hipergrafia, mas a causa. Talvez os escritores pudessem recuperar o conceito de bloco, já que São Jerônimo, em seu estudo, usou um memento mori (uma caveira, ou uma ampulheta com as areias do tempo escapando) para conduzir seu trabalho, naquelas lindas pinturas renascentistas. [...] Os escritores têm mais depressão unipolar do que o resto da população; os mesmos estudos que encontraram uma incidência dez a quarenta vezes maior de doença maníaco-depressiva em escritores encontraram uma incidência oito a dez vezes maior de depressão unipolar. [...]. Trechos extraídos da obra The Midnight Disease: The Drive to Write, Writer's Block, and the Creative Brain (Harper Paperbacks, 2005), da neurologista, educadora e pesquisadora estadunidense Alice Flaherty. Veja mais aqui.

 

PÓ EXISTENCIAL

Imensidão de vagos \ evacuando na inanidade \ da vacuidade \ em viagem infinda \ de vácuo absoluto. \ Sentido, sem direção. \ Sentido, sem solução. \ Sentido, sem sentido.

Poema Vacuidade de sentido, extraído da obra Pó existencial (Criaart, 2024), do poeta e artista plástico José Durán y Durán. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

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MEMÓRIA MATA SUL

Autogestão da Memória, Museus Comunitários e Museologia Política - De 11 a 13 de abril de 2024 Cidade dos Palmares, Mata Sul/PE. A oficina-vivência Autogestão da Memória, Museus Comunitários e Museologia Política em Palmares acontecerá na sede da Biblioteca Pública Fenelon Barreto, reunindo 25 articuladores de Movimentos Sociais de Buíque, Escada, Jaboatão dos Guararapes, Jaqueira, Olinda, Palmares, Paudalho, Paulista, Recife, Rio Formoso, Vitória de Santo Antão e São José do Egito. A articulação da ELMP na Mata Sul ocorreu em parceria com o Movimento de Retomada Mata Sul Indígena, Amigos da Biblioteca (ABI) & Semed-Palmares – Biblioteca Fenelon Barreto.

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ARREIA!...

Espetáculo de dança da arte-educadora, bailarina, atriz e performer, Íris Campos, e da artista da dança e do teatro, arte-educadora e produtora cultural, Iara Campos, com enredo que constrói relação entre o universo dos sonhos e a criação da agremiação Caboclinho 7 Flexas do Recife, construindo uma narrativa que honra a ancestralidade indígena, inserindo novos conceitos de preservação da manifestação. O espetáculo conta com a direção de Paulinho 7 Flexas. Arreia. Dias 12 e 13 de abril, 20h, Teatro Cinema Apolo – Palmares - PE. Veja mais aqui.

 

UM OFERECIMENTO: SANTOS MELO LICITAÇÕES

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Teatro Infantil: O lobisomem Zonzo aqui.

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Crônica de amor por ela aqui.

 

FABIENNE BRUGÈRE, WARSAN SHIRE, FATOU DIOME, ANTÔNIO MADUREIRA, POEMA & POESIA NA ESCOLA!

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Sirens (Zone Records, 1994), Passionate Voice (2004), Rough and Steep (2006), The Ten Tho...